O gaúcho de Santa Cruz do Sul, Luiz Maganini Faccin, tem 38 anos e pedala há pelo menos 23 anos.
Faccin já disputou nada menos que 17 corridas do tipo Audax. A primeira foi de 200 km, em 2004, em Porto Alegre. Antes de disputar a Paris-Brest-Paris, a prova mais importante do calendário Audax, Faccin participou de um evento Audax de 600 km no ano passado, em Campinas (SP).
Confira o breve relato de Luiz Faccin – [email protected]
Fotos: arquivo pessoal
A largada da Paris-Brest-Paris foi numa noite de chuva, mas sem muito frio. Eram 21h30 do dia 20 de agosto de 2007. Pedalei mais com o Jorge, português que fazia sua quinta PBP, e a Silvie, que é francesa e também vestia a camisa do Brasil.
Gostei muito de passar em Logni Au Perche e principalmente de ver a igreja iluminada na madrugada. Está foi a primeira amostra das dezenas de igrejas e belas vilas por onde passaria nos próximos dias e noites.
No começo, pedalávamos sempre no vácuo dos outros ciclistas, fila interminável. Choveu muito ao meio dia e paramos para almoçar no PC e, ao descer escada molhada, caí, bati o cotovelo esquerdo, braço direito e as costas. Achei melhor não procurar a enfermaria do PC. “Até o Audax devo estar curado”, pensei.
Saí do PC de Tinteniac, no KM 365, e andei uns 8 km quando o núcleo do meu cassete começou a falhar, até que não pegou mais. Bati e ele funcionou. Andei mais de 40 km sem parar de pedalar, freando na decida e pedalando sem parar na subida. Estava cansado e não conseguia manter sempre a corrente esticada e girando.
Estava pensando na possibilidade de desistir e me preparando psicologicamente para isto. Não sei quantas vezes parei. Rodei mais de 75 km e cheguei no posto de controle de Loudeac. Dormi 3h30 minutos no carro. Comprei uma roda traseira, peguei as coisas rapidamente, tomei café e saí para continuar na prova.
SEGUNDO DIA
Depois de Loudeac, andei um tempo sozinho, ainda no escuro. Cheguei no próximo PC (Carhaix), faltando 45 minutos para o fechamento, e não demorei muito. Já era o meu segundo dia na competição e as condições climáticas melhoraram, mas havia vento muito forte e muita subida e previsão do tempo falava em ventos de até 60 km/h e ele assoviava na bike, nunca tinha acontecido isto antes.
Estava chegando a mais uma vila medieval, Sizun, que tem uma igreja linda, uma subida, bares e lojinhas. Estava quente e os bares estavam cheios de ciclistas famintos, cansados, fedidos, alegres. Furei o pneu traseiro, comi e bebi e saí logo depois de trocar a câmara de ar. Falta muito ainda para chegar a Brest, mais longe ainda com vento contra.
Estava chegando no Finistere e tinha muita subida. Alcancei um casal em uma tamden e a mulher me disse que faltavam 4 km de subida, mas depois havia 16 km de descida. Pensei: “Se tem 16 km de descida, na volta serão 16 de subida”.
A chegada em Brest foi emocionante e com calor, mais emocionante ainda foi ver um senhor tocando gaita de fole da Bretanha em uma esquina. Em Brest, comi massa, molho, arroz e deitei um pouco na grama e sol para descansar.
Agora só faltava voltar. Só isso? Parece fácil? O vento era a favor, ou lateral, e eu andava no meu ritmo, mais ou menos 25 km/h.
No final da subida (16 km) tinha muitos carros e muita gente oferecendo água, banana, café, lembrava a Tour de France. Cheguei novamente em Sizun e parei para tomar um sorvete e uma Coca-Cola, no Café du Centre.
Cheguei a Carchaix e a chuva voltou. Jantei o cardápio básico de sopa, arroz, molho e massa. Depois de Carchaix, segui para o próximo PC e para enfrentar a noite. Estava motivado, mas consciente, sempre conseguindo chegar com um tempo de sobra nos PCS.
TERCEIRO DIA
A noite estava chegando, seria a terceira noite no PBP e a chuva forte veio antes do escurecer. Cheguei em Loudeac quase 23 h e chovia! Eu tinha tempo para dormir, mas aonde?
Depois do banho eu fui para o restaurante comer alguma coisa. O restaurante estava lotado de gente dormindo. Comi algo a saí à procura de algum lugar para dormir. Não tinha outra opção e dormi no carro novamente.
Acordei para o terceiro dia de PBP motivado e concentrado. Limpei os pensamentos e a única coisa era pedalar, ver a paisagem, curtir pequenos momentos e conversas no caminho.
Estava curtindo o PBP. Eu não tinha a noção exata do tempo, continuava sem olhar as horas e não me preocupava com a chegada, mas em pedalar no meu ritmo e ver lugares que não havia visto antes. Estava chegando onde eu queria, estava cada vez mais perto do KM 900, sem estar com dores e sem estar desmotivado.
Eu resolvi parar e o Richardt me alcançou. Feliz, gritou para eu pedalar. Foi muito bom pedalar com ele por algum tempo, me motivei, falei alguma coisa em português e tinha um companheiro. Chegamos e saímos juntos do PC de Tinteniac. Antes de Fougeres, deixei o Richard para trás, quando ele parou em uma vila e eu segui.
QUARTA NOITE
Em Fougeres, sob chuva, comi bem e deitei um pouco antes de sair, o que me ajudou muito. O importante era o seguinte: a noite estava chegando e eu havia pedalado uma noite toda, dormi outras duas em Loudeac e eu estava na quarta noite de PBP, a ultima!
Cheguei a Montagne au Perche às 00h30 e deitei-me no chão, perto da entrada. Dormi 15 minutos e acordei com frio, mas sem sono e bem mais descansado. Tomei café, comi algo e segui a viagem.
Senti sono, muito sono na ultima noite!
Cheguei em Dreux, o último PC, ainda cedo com tempo suficiente para fazer mais 78 km até a chegada. Esse seria o último dia do PBP, o quarto dia de pedaladas.
Dormi 15 minutos com a cabeça em cima da mesa e acordei. Tomei café, comi e segui pedalando rápido por uns 30 km até chegar em várias subidas em uma floresta, aí fui no ritmo normal, sem muita pressa. Estava acabando o PBP.
Eu sentia um misto de alegria e tristeza, afinal eu tinha dedicado bastante tempo esperando, planejando e pensando nessa prova e ela já estava acabando.
Próximo à chegada, choveu de novo e eu me molhei, estava com a camisa do Brasil e queria chegar com ela, sem colocar o corta vento. Havia muita gente torcendo a gritando e cheguei às 12h26 e completei a Paris-Brest- Paris em 86 horas e 57 minutos.
Fiquei um tempo no ginásio conversando com o pessoal, peguei uma carona e fui para o hotel.



