Texto de Marcos Adami – Fotos de divulgação Presidential Tour of Turkey
Em abril de 2011 o Bikemagazine cobriu com exclusividade uma etapa da Volta Presidencial da Turquia. Desde que subiu para a categoria 2 HC em 2009, a corrida de oito etapas tem atraído cada vez mais as principais equipes do circuito mundial de ciclismo.
Com sólidos investimentos públicos, o evento não economiza recursos e estrutura, que se equiparam ao Tour de France, Giro D’Italia e Volta a Espanha. O país foi escolhido pela UCI para receber o Campeonato Mundial de Ciclismo em 2015 e tem como objetivo principal sediar os Jogos Olímpicos até 2020.
Os números da prova impressionam. A caravana é formada por mais de uma centena de veículos e 1.400 pessoas. Cada equipe tem direito a dois carros de apoios (um na frente ou na fuga e outro para acompanham os atletas sobrados) e duas vans, uma para transportar os atletas e outra só para as bagagens.

Murilo Fischer
A cobertura de imprensa é igualmente grandiosa, com mais de 100 jornalistas de 400 veículos, duas agências internacionais de notícias e transmissão ao vivo em 28 línguas para 123 países em alta definição. Todos os dias um jornal é publicado com as notícias da etapa anterior e distribuído a todos da caravana e ao público que se aglomera para prestigiar o evento. A prova reuniu seis equipes profissionais, 14 continentais e dois times Pro Tour.
Esse ano, a 47ª edição da corrida começou no dia 24 de abril, em Istambul, e terminou no dia 1º de maio em Alanya, na costa do Mar Egeu, com suas cristalinas águas azuis turquesa.
Largaram 168 ciclistas de 22 equipes vindos de 38 países, entre eles o catarinense Murilo Fischer, bicampeão brasileiro de estrada que defende a equipe norte-americana Garmin-Cervélo e que nos ajudou nessa reportagem.
POR DENTRO DA QUINTA ETAPA
9h30 – Tomo um rápido café e penso como será a experiência de andar 184 quilômetros pela primeira vez no carro de apoio de uma equipe Pro Tour.
10h15 – As vans com os atletas começam a chegar, depois chegam os carros de apoio e tomam o seu lugar na caravana. Procuro e apresento-me a Fernandez Bingen. O chefe da equipe me recebe com simpatia e me encaminha ao segundo carro de apoio.

10h40 – Nosso carro é o primeiro da caravana. No assento do motorista, Fernandez, um ex-ciclista profissional da Cofidis nascido no País Basco espanhol e diretor esportivo da Garmin-Cervélo desde o ano passado, observa atentamente a classificação geral e assinala os atletas que mais ameaçam a liderança do americano Thomas Peterson, que conquistou a camisa turquesa de líder na etapa anterior. O dia prometia ser duro, afinal, outros ciclistas iriam batalhar pela posse daquela camisa.
10h55 – Murilo vem ao carro buscar as luvas e confirma: “Hoje a pressão vai ser grande. Pegamos a camisa de líder ontem”.
11h10 – O pelotão se move, neutralizado, pelas ruas estreitas de Fethiye em direção à estrada para receber a bandeirada de largada às 11h26. O segundo carro de apoio é comandado pelo inglês Garry Beckett, que tem a missão de cobrir a retaguarda da equipe enquanto Fernandez conduz o primeiro carro de apoio lá na frente, logo atrás do carro do comissário.
11h40 – Um grupo com 12 atletas sai numa fuga, mas é neutralizado logo adiante. O pelotão está tranquilo e a Rádio Tour idem. Ouço as histórias de Garry, um típico londrino e cheio de histórias interessantes, que praticamente nasceu em um velódromo. Seus pais eram ciclistas e se conheceram num velódromo de Herne Hill, que recebeu os Jogos Olímpicos de Londres em 1948. “No dia em que nasci, fui registrado como membro do BEC Cycling Club. O clube é de 1924, meu pai foi presidente e passou a batuta para mim. Em breve vou passar o bastão para meu filho”.
12h09 – O vento passa a soprar a favor e facilita a vida dos ciclistas. Tudo calmo no front e passo o tempo ouvindo mais histórias. O ciclismo de pista já foi o lazer número um dos ingleses nos anos 50 e 60, mas não resistiu à chegada da TV, conta o inglês.
12h20 – Garry continua. Houve um tempo em que era proibido pedalar nas auto-estradas inglesas e os ciclistas driblavam a polícia disputando provas dissimuladas de crono individual com roupas “à paisana”. “Marcávamos tal dia e tal hora em determinado percurso que só nós conhecíamos”, explicou. “Não é a toa que até hoje o Reino Unido tem ótimos ciclistas de crono”, penso.
12h33 – Na passagem pelo quilômetro 50, a Rádio Tour anuncia que 10 ciclistas, entre eles o alemão André Greipel, estabelecem dois minutos de vantagem sobre o pelotão. A estrada é ao lado do mar. Maravilha de mar cor de turquesa com prainhas escondidas de vez em quando.
13h20 – O pelotão alcança uma dura subida de serra e passa pelo primeiro prêmio de montanha no quilômetro 88 às 13h26.
14h10 – Outra serra dura no caminho dos ciclistas. Faz calor e alguns ciclistas começam a sobrar.
14h19 – Abatido pela dura subida e sofrendo com uma forte gripe, o americano Travis Meyer abandona a prova e embarca no carro. Faltam 56 km para a chegada e o pelotão se dividiu em três grandes grupos. O russo Efimkim saiu numa fuga e, virtualmente, já é o novo líder da prova. A equipe não se abala e aceita com tranquilidade a perda da liderança.
15h05 – Alguns atletas vêm ao carro em busca de água, Coca-Cola, isotônico e comida. Consultado, Murilo agradece e dispensa o abastecimento.
15h37min – O alemão André Greipel, da Omega Pharma Lotto, bate no sprint um grupo de 27 ciclistas. Foram 4h27min02s de prova a 41,34 km/h de velocidade média. Murilo chegou na 89ª colocação junto com 65 ciclistas num terceiro grupo que cruzou a meta 19 minutos atrás do alemão. O russo Efimkim assumiu a camisa turquesa de líder e a levou até o final em Alanya no dia 1º de maio.

16h33 – No gigantesco hotel resort, com mimos que incluíam uma praia particular na paradisíaca Olun Deniz, os mecânicos entram em ação e começam as revisões para o dia seguinte enquanto os atletas avançam no buffet e se retiram para os quartos. Faltavam ainda três etapas para o final.

RESULTADOS FINAIS
INDIVIDUAL
1 Alexander Efimkin – Rússia – Team Type 1 – 30h22min49s
2 Adrey Zeits – Cazaquistão – Astana – a 1min13s
3 Thibaut Pinont – França – FDJ – a 1min33s
4 Thomas Peterson – EUA – Garmin-Cervélo – a 1min50s
5 Cameron Wurf – Austrália – Liquigas – a 2min17s
PONTOS:
1 Alessandro Petacchi – Itália – Lampre – 69 pontos
2 Van Dijck Stefan – Holanda – Veranda’s Willerms-Accent – 52 pontos
3 Tylor Ferrar – EUA – Garmin-Cervélo – 49 pontos
MONTANHA:
1 Luis F. Jimenez – Colômbia – Colômbia Es Pasion – 26 pontos
2 Alexander Efimkin – Rússia – Team Type 1 – 20 pontos
3 Yohan Bagot – França – Cofidis – 16 pontos
EQUIPES:
1 FDJ – 101h39min41s
2 Astana – a 1min32s
3 Cofidis – a 11min52s
4 NetApp – a 14min16s
5 Garmin-Cervélo – a 24min43s
Clima de festa
Por Daniela Melillo
Clima de festa no ar. Bandeiras hasteadas e ruas interditadas davam o sinal de que aquele era um dia especial. A turística Fethiye iria receber os ciclistas da Volta da Turquia. A cidade de cerca de 60 mil habitantes banhada pelo azul do Mar Mediterrâneo contagiou a todos com sua animação.
Quando os ciclistas finalmente cruzaram a linha de chegada, quem havia esperado por aquele momento comemorou pra valer. Para nós, do Brasil, era hora de cumprimentar o atleta Murilo Fischer, o único brasileiro da prova. Ao vê-lo, com a bandeira verde e amarela no uniforme, corri para fazer uma foto.
Pena que, no mesmo momento, um comissário da UCI o escolheu para fazer o controle antidoping. Apenas nos cumprimentamos rapidamente. Lembro-me de que pensei em como o catarinense estava mudado – a primeira vez que o entrevistei para o Bikemagazine foi em Indaiatuba, quando ele venceu o GP Ayrton Senna, há uns dez anos… Já o encontrei muitas outras vezes, mas agora pareceu que havia passado uma vida. O garoto virou adulto e busca a linha de chegada entre os tops do circuito mundial.
Como repórter do site Bikemagazine, já fui a muitas provas. Ali, no meio dos jornalistas que cobriam a Volta da Turquia, a correria é a mesma: todo mundo precisa mandar seus textos, postar as fotos e os vídeos, fazer entrevistas, buscar novidades. A diferença é que a sala de imprensa é uma babel, cada um fala uma língua – e ninguém fala turco! Para se entender, só mesmo em inglês.
Passada a euforia da chegada, a contagem dos tempos e o anúncio da classificação geral, chega a hora de se preparar para a largada do dia seguinte. O percurso entre Fethiye e Finike vai seguir a costa mediterrânea. A cidade amanhece preparada para se despedir dos ciclistas.
O carro de imprensa deve seguir na frente do pelotão, mas há tempo para circular pelo bufê de café da manhã antes da partida. Em um canto, um grupo de ciclistas italianos devora os deliciosos simits, o típico pão com gergelim dos turcos, enquanto levam uma conversa bem animada. Entre eles está Alessandro Petacchi, um dos maiores sprintistas da atualidade. Até que uma integrante da organização o leva para o palco montado ao lado. A italiana Barbara Pedrotti, apresentadora-musa do evento, o entrevista enquanto seus companheiros de equipe aproveitam os últimos minutos antes da largada.
A viagem até Finike é deslumbrante. O azul do Mediterrâneo acompanha a vista e, nas margens da estrada, crianças em uniforme escolar esperam pacientemente pela passagem dos ciclistas. Agora, a festa é delas.
Mais uma cidade se transforma para a Volta. O calor é forte, o mar é convidativo, mas o show tem que continuar.



