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Confira dicas que valem para ciclistas de todas as modalidades e estilos

Confira dicas que valem para ciclistas de todas as modalidades e estilos

Do Bikemagazine
Fotos de divulgação

Olá leitores do Bikemagazine,

Já faz algumas semanas desde o último texto da nossa coluna, mas estou de volta com muitos temas frescos para apresentar daqui para a frente. Durante esse período, tive várias oportunidades de pedalar junto com ciclistas iniciantes, e observei pequenos detalhes que sempre tornam o pedal mais sofrido e arrastado. Mesmo que a performance não seja a prioridade, é sempre gostoso ser capaz de manter um ritmo melhor e desenvolver uma resistência mais sólida, e o mais importante, terminar o pedal sentindo-se “inteiro”, por mais longo e duro que tenha sido o dia.

Sempre digo aos meus atletas que o segredo está nos pequenos detalhes. Somados, fazem muita diferença no final. É a ideia que a equipe britânica Sky tornou mundialmente famosa por meio do conceito de “ganhos marginais”.

Mas como conectar a filosofia de trabalho do esporte de alto rendimento ao cotidiano do ciclista médio comum? No texto de hoje, reuni comentários sobre essas observações que andei fazendo e deixarei algumas dicas aproveitando o conceito de pequenos benefícios em pequenos detalhes. As dicas valem para ciclistas de todas as modalidades e estilos, e são coisas tão simples que o leitor poderá colocar em prática imediatamente. E o mais importante, são dicas que não prejudicam a liberdade de sair e pedalar livremente, sem uma rotina rígida de tiros e exercícios para serem executados.

 Mesmo que a performance não seja a prioridade, é sempre gostoso ser capaz de manter um ritmo melhor

Mesmo que a performance não seja a prioridade, é sempre bom melhorar o ritmo

Acerte o ritmo e poupe para o final
Uma das melhores sensações que um bom treino pode propiciar é chegar em casa “inteiro”, e ainda assim sabendo que fez um bom volume e que pedalou forte. Se você costuma chegar muito cansado, é provável que suas pedaladas seguem o esquema “aquecer, forçar e se arrastar”. Na sua próxima saída, experimente mudar para o esquema “aquecer, girar e forçar”. Nessa estratégia, você pedala mais leve que o normal por 80 a 85% do tempo ou da distância planejada, de forma que você chegue a sentir certo peso na consciência por ir tão lento. Após esse período, force pra valer, dando tudo o que tem, e reserve os últimos dez minutinhos para girar leve e soltar as pernas. Esse é um treino simples que traz tanto benefícios fisiológicos quanto psicológicos!

  • Primeiro, esse esquema induz a utilização prioritária, e por muito mais tempo, das fontes “lentas” de energia por meio do metabolismo oxidativo. Ou seja, o principal combustível serão as gorduras e carboidratos. No final do treino, no momento da intensidade, haverá maior participação dos carboidratos sobre a gordura e bastante demanda dos metabolismos anaeróbios. Ao fazer isso recorrentemente seu organismo irá “aprender” a prospeccionar melhor as gorduras como fonte de energia, poupando os carboidratos para os momentos de maior intensidade.

  • Segundo, ao seguir tal estratégia, ocorre uma percepção muito agradável e satisfatória do treino. Você irá pedalar distâncias maiores com menor desgaste e estará com toda a disposição no final, quando geralmente muitos costumam se sentir acabados.

  • Mas nem tudo são flores. Ao treinar sempre assim, você perde a oportunidade de desenvolver outras capacidades. Procure a orientação de um profissional da área para elaborar uma rotina otimizada de treinos.

Evite acelerações desnecessárias
Costumo dizer aos meus atletas que cada esforço anaeróbio durante o treino ou competição é como fazer uma compra no cartão de crédito. Por agora pode parecer tudo bem, mas depois a fatura chega, e chega pra valer. E saiba que não é preciso levar sua frequência cardíaca nas alturas para entrar no metabolismo anaeróbio! Toda vez que você aumenta o ritmo do “muito fácil” para o “fácil”, ou do “fácil” para o “moderado”, ou mesmo toda vez que você levanta do sofá, começa a caminhar ou dá aquela corridinha de dois passos para pegar o elevador, você entra em um curto período de débito de oxigênio.

Isso acontece pois seu corpo leva um tempo para reagir ao estímulo e suprir a nova demanda de energia. Para permitir que você execute essas tarefas simples, entra em ação o metabolismo anaeróbio, que não depende do oxigênio. Após alguns segundos, sua FC irá elevar, sua respiração ficará um pouco acelerada e a demanda de oxigênio será cumprida. Parece complicado?

Cada pequena aceleração que você faz durante o treino para retomar a última roda no pelotão, para fazer aquela graça na frente do grupo ou para compensar o embalo que você perdeu porque freou na descida, é uma aceleração que poderia ser evitada. E cada aceleração dessa induz o débito de oxigênio, que por sua vez exige anaerobiose, consumo de fontes rápidas de energia e liberam ácido lático, mesmo que em pequenas doses. Lembra da analogia com o cartão de crédito? O problema é que, após várias dessas pequenas “compras”, pode ter certeza que é naquela subida dura no final ou quando o pelotão apertar o passo que a fatura vai chegar. E se você optar por pagar o mínimo, vai ficar para trás.

  • Seja esperto e antecipe os movimentos de quem está pedalando com você, mesmo que o ritmo seja tranquilo. Ficou um pouco para trás? Recupere o terreno perdido com cuidado e sem gastar nada a mais que o necessário. Deixou seus colegas para trás? Apenas reduza um pouco o ritmo e continue na sua. A constância no ritmo é muito importante.

  • Se a subida é longa, comece sempre em ritmo controlado. Se quiser aumentar a velocidade, faça aos poucos, sempre dosando o esforço e respirando profundamente e com calma.

  • Se você utiliza um medidor de frequência cardíaca e/ou medidor de potência, aprenda a definir os critérios necessários para controlar seu esforço, mesmo que seu intuito seja ser mais rápido que todo mundo. Não foi olhando para cima que Chris Froome venceu 3 Tour de France!

Não perca o embalo. Nunca!
Você gastou muita energia subindo o morro, certo? Pois o momento da descida é a hora da recompensa. Seja na trilha ou no asfalto, não aproveitar ao máximo a energia grátis da gravidade é um tremendo desperdício. Tente ser fluído e dinâmico para descer com segurança e velocidade e simplesmente não perca a inércia. Isso não só vai ajudar a ter uma média final mais alta (e chegar em casa mais cedo para o almoço), mas também vai ajudar as coisas quando a descida acabar.

  • Evite frear desnecessariamente! Dentro dos limites da boa segurança, desfrute a velocidade e o vento no rosto. Deixe o bate-papo para quando as coisas estiverem menos radicais!

  • Evite ser freado pelo vento. Encolher um pouco o corpo ajuda a reduzir sua área frontal, e portanto, reduzir a resistência do ar. Não precisa descer como o Sagan ou o Froome na estrada, mas o tronco ereto é um pára-quedas muito desnecessário.

  • Mantenha o corpo solto. Membros e tronco rígidos na descida são ruins, muito ruins. Se você aprender a ficar mais relaxado, com as articulações flexionadas “lendo” ativamente os obstáculos (um quebra-molas, uma raíz, uma pedra ou mesmo o asfalto ruim), você será mais rápido na descida, e chegará lá embaixo com menos dores no corpo e menos chances de ter caído.

  • Terminou a subida com as pernas cansadas? Aproveite a descida para… continuar pedalando, mesmo que bem de leve. Mantenha sempre os pedais em movimento! Isso vai evitar que a musculatura enrijeça e as sensações fiquem ruins no fim da descida, quando você tiver que voltar a pedalar normalmente. De quebra, isso aumenta o tempo de pedalada efetivo no treino e ajuda a melhorar seu condicionamento.

Preste atenção no piso e nos seus pneus
Existe algo que todos os ciclistas gostariam de banir da existência (além do vento contra): a dor no traseiro. Para alguns ela aparece após poucos minutos, para outros, após muitos quilômetros. Mas ela aparece e torna a vida do ciclista mais difícil. Já pensou em um sistema de amortecimento que serve para qualquer bike, não acrescenta peso, não custa nada a mais, não exige manutenção complicada e nem rouba energia da pedalada? Pois existe, e são os pneus! É muito comum encontrar gente que enche os pneus ao máximo, possivelmente acreditando no mito de que “quanto mais cheio, melhor”.

Especialmente entre ciclistas de estrada, quando pergunto, a resposta é sempre a mesma: “ah, eu ponho cento e vinte…”. Para quem pesa mais de 80kg e pedala com pneus de 23mm em um asfalto brilhante de tão perfeito e liso, tudo bem. Mas quanta dor no traseiro poderia ser evitada com um cuidado maior com a pressão dos pneus! A indicação na lateral do pneu é o máximo permitido, e não o sugerido. Muitas vezes essa indicação é até superior ao máximo recomendado pelo fabricante do aro. Portanto ela precisa ser relativizada.

  • Para quem pedala em bikes de estrada, o primeiro passo é entender a largura do seu pneu. Quanto mais largo, maior o volume de ar e menor a necessidade de pressão para suspender o peso do conjunto bike + ciclista. Pneus 700*25 são equivalentemente inflados com cerca de 20 PSI a menos que um 700*23. Se for um 700*27, a pressão é ainda menor.

  • Se o asfalto for ruim, quebradiço ou com textura muito abrasiva, vá experimentando pressões ainda menores. Uma bike mais macia vai ajudar a absorver a vibração e pequenos impactos, e você vai perder menos inércia com esses abalos. Chegará um ponto em que você começará a sentir a bike mole demais e reagindo de maneira estranha, e esse é o sinal de que a pressão foi baixa demais. O segredo é encontrar o ideal para o piso predominante em cada local que você costuma pedalar. Acredite: a maioria dos ciclistas não vai perceber a diferença na resistência à rolagem em um pneu inflado um pouco abaixo do “ótimo”, mas todos vão perceber os benefícios no traseiro após um pedal longo no asfalto ruim. Não seja rígido, experimente!

  • Para quem anda fora da estrada, o tema da pressão é ainda mais complicado, mas os mesmos exageros mencionados acima também acontecem. Se você gostaria de usar um pneu menos inflado para perceber conforto mas tem medo de snake bites (furos por impacto), procure desenvolver melhor sua técnica para “flutuar” com mais eficiência e siga as dicas anteriores. Você será um mountain biker melhor, mais dinâmico, mais rápido nas trilhas e ainda terminará o pedal com o corpo menos açoitado pelos impactos.

O calor e o frio podem drenar sua energia
Se você está passando frio ou calor durante o treino, saiba que parte da energia que poderia ir para os pedais é desperdiçada com a regulação térmica. No calor o caso é ainda mais grave, pois com a sudorese excessiva perdemos sais fundamentais no processo da contração muscular, como potássio e cálcio. Sem falar da desidratação e do desconforto geral.

Sobre o frio, já deixei algumas dicas em uma coluna recente (Leia aqui). Para o calor, a primeira dica é evitar o sol. Lembra a história de que cada cigarro fumado é um minuto a menos de vida? Com o sol é semelhante. A cada minuto pedalado sob condições escaldantes, uma unidade de prazer é retirada da sua pedalada (que podem ser repostas com uma água de coco gelada, contudo).

  • Fique esperto com o calor. Suar mais NÃO significa que você está queimando mais calorias e ficando em melhor forma. Portanto isso não é algo legal e desejável. Reponha o líquido e sais perdidos com as dicas de hidratação que darei adiante.

  • Em pedaladas longas, daquelas que levam horas, não dê bobeira sob o sol. Furou o pneu ou está esperando o companheiro que sumiu na trilha? Vá para a sombra.

  • Use protetor solar. Não apenas previne câncer de pele e marcas de envelhecimento, mas também poupa a energia que o corpo precisará para se recuperar dos danos causados pelo sol. Não é à toa muitas pessoas sentem fadiga e até febre após passar uma tarde inteira repousando sob o sol sem proteção.

  • Está frio cedinho, na hora de sair, mas depois vai esquentar? Vá vestido adequadamente para isso e pense adiante. É melhor sentir um pouco de frio na primeira meia hora do que passar as quatro horas seguintes derretendo sem ter onde guardar seus pernitos, sua segunda pele de manga longa, as três bandanas, o corta-vento e a jaqueta de fleece que você está usando. Sim, era melhor ter deixado no carro. E sim, é melhor amarrar tudo no canote com uma câmara de ar do que ficar vestindo tudo isso!

Mantenha o tanque cheio e evite o “prego” a todo custo
Entenda imediatamente que o ciclismo de estrada e o mountain bike NÃO são esportes de sobrevivência. Não há glória em ir fazer aquele pedal bacana em grupo e depois ter que ser empurrado por duas horas porque não levou nada para comer e está sofrendo do famoso “prego”.

Toda vez que você sente fome na bike, o treino deixa de ser uma construção e vira uma destruição. Parece exagero, mas pense: se seu tanque está vazio e você continua em movimento, qual combustível você está queimando, então?

Adotar estratégias adequadas de alimentação e hidratação na bike fazem uma diferença gritante. E o mais interessante é que seu corpo se acostuma a isso, e após um tempo ainda mais benefícios são percebidos.

  • A nutrição correta começa, no mínimo, na véspera do pedal, passa pelo que você come antes, durante e também após o treino. Um bom nutricionista esportivo irá analisar suas necessidades para indicar o que é adequado.

  • Durante o treino, vale a regra de comer antes de sentir fome e beber antes de sentir sede. Se já sentiu o estômago roncando ou a “moleza” chegando, saiba que mesmo que você pare e coma, o treino do dia já foi prejudicado pela depleção de nutrientes.

  • Há muitas opções práticas que vão bem nos bolsos da camisa: bananas (ainda meio verdinhas, pois elas amadurecem rápido durante o treino!), pãezinhos com creme de amendoim no papel alumínio, géis de carboidrato, barrinhas de cereais caseiras, bolinhos de arroz, pães de mel, paçocas, barras de proteína, cookies de aveia… não há desculpa para ficar de tanque vazio no meio do nada!

  • A indústria dos suplementos vai apresentar muitas opções caras e complexas, mas um bom isotônico em pó (que custa cerca de R$25,00 pelo pacote de 900g e dura muito) faz maravilhas, sem deixar sua boca e a sua bike toda melada. Esses produtos tem uma quantidade razoável de carboidratos e repõem boa parte dos sais perdidos pelo suor e consumidos pelo exercício. Como complemento, as famosas cápsulas de sais são excelentes, especialmente para quem sofre com cãibras.

  • Como ponto de partida, adote a ingestão de 60g de carboidratos e 500 ml de líquidos por hora durante o treino. Evidentemente, isso varia de acordo com a pessoa e intensidade do exercício, e por isso é importante procurar a orientação de um nutricionista. Mas para quem está acostumado a ficar “pregado” todo domingo, seguir essa dica já será um enorme benefício!

Além do que foi escrito, existem inúmeros outros pequenos detalhes que ajudam a irmos mais longe e mais rápido em uma bicicleta. Observe os ciclistas experientes, faça perguntas, e sempre coloque tudo em perspectiva. Se tiver dúvidas, comentários ou sugestões, mande para nós!

Até a próxima!

Gabriel Vargas
Treinamento em ciclismo
www.gabrielvargas.com.br