Texto de Gustavo Cebo
Fotos: Guilherme Haruo / Gustavo Cebo / Marini
Pedais de encaixe, bikes full-suspension, pneus tubeless, freios a disco, canote retrátil, ajuste postural por meio do bike fit. O mundo do mountain biking é recheado de tecnologias que revolucionaram o desempenho e a prática do esporte. Agora, a telemetria BYB surge como mais uma candidata a integrar esse seleto grupo de inovações que se tornaram praticamente indispensáveis, transformando a maneira como os ciclistas enfrentam as trilhas e levando seu desempenho a um novo patamar.
Mas será que essa tecnologia, que promete ajustar perfeitamente a suspensão da sua bike em apenas algumas horas, utilizando uma metodologia baseada na análise precisa de uma grande quantidade de dados, pode realmente mudar a maneira como você ajusta e pilota a bicicleta?
Para conferir, a equipe da Bikemagazine esteve presente na apresentação da telemetria criada pela italiana BYB, em um evento realizado nas cidades de São Paulo e São José dos Campos. O evento incluiu uma aula de apresentação do produto e um dia de testes práticos nas trilhas do Mobai, em São José dos Campos, nos dias 18 e 19 de novembro de 2024.
No evento promovido pela Corsa Bike Parts, importadora responsável por trazer a telemetria BYB ao Brasil, e pela Escola Park Tool, que oferece um curso dedicado ao uso e aplicação dessa tecnologia, membros selecionados da mídia especializada em ciclismo tiveram a oportunidade de conhecer essa novidade de perto. Representando a Bikemagazine, Gustavo Cebo, experiente ciclista e bike tester, participou para avaliar os prós e contras dessa inovação, trazendo sua bagagem em testes de diversos produtos voltados para o mundo da bike.
A ideia é que todo o sistema, juntamente com o curso técnico, seja comercializado para lojistas, funcionando como uma espécie de “Bike Fit 2.0” — um termo que foi repetido diversas vezes pelos participantes do curso. No entanto, assim como no ajuste postural, ter o equipamento em mãos é provavelmente a parte mais simples do processo. Afinal, a “pecinha” que fica atrás do computador, também conhecida como analista de telemetria, é quem realmente faz a diferença.
Para realizar o processo, o analista de telemetria deve acompanhar o piloto em uma trilha que possa ser percorrida mais de uma vez, como um circuito de XCO ou uma especial de enduro, por exemplo. Após uma primeira volta para coletar os dados, é feito um ajuste inicial na suspensão. Em seguida, o piloto retorna ao percurso para uma nova volta — o procedimento pode ser repetido quantas vezes forem necessárias.
O que é a telemetria BYB?
De forma simples, a telemetria da BYB é uma ferramenta que analisa os dados coletados por diversos sensores instalados na bicicleta, permitindo ajustes precisos no garfo e no shock. Esses sensores monitoram o curso das suspensões, o posicionamento dos freios, além de incluir giroscópios, acelerômetros, GPS e medições de velocidade. Com essas informações, um técnico especializado pode ajustar com precisão a suspensão da bike e identificar pontos onde o atleta está perdendo tempo.
Mas, como você verá a seguir, “simples” não é exatamente a palavra que descreve todo o processo da telemetria. Afinal, assim como o bike fit, o processo exige algumas horas de “trabalho”. Felizmente, esse trabalho envolve pedalar com sua bike em sua trilha favorita e presenciar a evolução dela de uma forma realmente notável.
Para se ter uma ideia, depois de realizar a primeira pedalada para coleta de dados e os primeiros ajustes, a bike já apresenta um ótimo desempenho, com uma melhora realmente notável já na segunda pedalada.
“Uma coisa que percebemos é que muita gente já fica satisfeita com o primeiro ajuste, já que ele faz uma diferença muito grande no funcionamento e no controle da bicicleta. Depois disso, os próximos ajustes são feitos para afinar o conjunto”, explicou Caíque Pereira, instrutor técnico da Escola Park Tool, responsável pela aplicação do curso de telemetria, pela análise de dados e pelas alterações nas bicicletas.
Para quem é a telemetria BYB?
Em uma primeira impressão, a telemetria parece ser mais indicada para pilotos de downhill, enduro e e-Mountain-bikers que buscam tirar o máximo de suas bikes durante uma descida. Mas, depois de conhecer o produto de perto, fica claro que ela é extremamente benéfica para qualquer ciclista que queira acelerar a bike de forma mais eficiente, e isso inclui pilotos de trail, cross-country e até mesmo de maratona.
Afinal, quando corretamente ajustada, uma bike de XC vai andar mais, com menos esforço do ciclista, além de oferecer mais conforto – algo que certamente faz toda a diferença em provas longas.
Isso porque, com uma análise de dados reais, a telemetria elimina completamente o “achismo” no ajuste da suspensão da bicicleta. Assim, regular a pressão, o volume das câmaras de ar e os botões de compressão e retorno se transforma em um processo científico, que adapta a bicicleta perfeitamente ao terreno e ao estilo de pilotagem do ciclista.
Mesmo ciclistas experientes, que têm um bom “feeling” para ajustar a bicicleta, vão se beneficiar, como exemplificado por uma situação ocorrida com nosso piloto de testes:
“Estávamos no Mobai, e os saltos lá realmente jogavam a bicicleta para cima. Antes de começar, fizemos um ajuste básico na suspensão, incluindo o SAG e a regulagem manual do retorno. Na primeira descida, percebi que a traseira estava jogando para cima nos saltos, fazendo a bike girar para frente ao sair da rampa. Isso geralmente acontece quando o retorno da suspensão traseira está muito rápido, o que pode acabar jogando o ciclista por cima do guidão. Pensei: ‘Preciso deixar esse retorno ainda mais lento’.”
Durante a análise, o técnico identificou que havia muito pouca pressão de ar no shock. Então, aumentamos a pressão sem mexer no retorno, que, segundo o sistema, já estava até lento demais, deixando a suspensão ‘morta’. Com o ajuste, a bike melhorou significativamente. Antes, com pouca pressão, a suspensão comprimia totalmente na rampa e retornava rápido demais. Com mais pressão, ela comprimia menos, retornava de forma mais controlada e deixou de me jogar para frente, o que me deu muito mais confiança para acelerar.
Isso mostra que, mesmo tendo bastante experiência, eu tirei uma conclusão errada. O técnico analisou e acertou o ponto. É impressionante como um detalhe pode fazer toda a diferença”, explicou Gustavo Cebo.
Uma aula sobre suspensão de bicicleta
Para entender como a telemetria funciona, a Escola Park Tool ofereceu para a mídia um dia inteiro de curso, que funcionou como um verdadeiro mergulho na tecnologia da BYB, com aulas indo das 9 da manhã até as 6 da tarde. Ao longo deste período, foi possível entender perfeitamente como todo o processo acontece.
Como citado acima, o processo envolve coletar e analisar dados, com a parte da coleta ficando a cargo dos seguintes sensores:
- Sensor de curso do garfo com até 210 mm de curso.
- Sensor de curso do shock com até 80 mm de curso.
- Sensor progressivo de acionamento de freios
- Sensor de GPS
- Sensor de velocidade
- O “cérebro” do sistema, que inclui giroscópio com eixos X, Y, Z, e acelerômetros
Já a parte da análise conta com:
- Programa de computador
- Aplicativo de celular
*É possível analisar os dados tanto no PC quanto no celular. No entanto, por motivos óbvios, o computador oferece vantagens na visualização das informações.
Além disso, o sistema de análise de dados pode ser compartilhado com outros programas como o Linkage, software de análise de geometria e de cinemática de suspensão de bicicletas, que inclusive é utilizado por projetistas, e com o DashWare, que permite unir os dados da telemetria com um vídeo capturado durante o pedal, proporcionando uma análise ainda mais completa – sim, dá para saber exatamente onde e quando sua suspensão bateu no fim do curso.
Durante a aula, os presentes absorveram uma grande quantidade de informações, aprendendo a função de cada uma das 14 telas de análise, o que cada gráfico significa e também como todo o sistema funciona, desde o cadastro do piloto e da bike até a quantidade de força G que a bike experimentou, como o curso da suspensão dianteira se compara com o traseiro e até mesmo a percentagem de acionamento dos freios.
Instalação do equipamento
Apesar de não ser complexo, a instalação do equipamento é relativamente demorada. Isso ocorre porque os suportes que acompanham o produto são universais, e muitas vezes é necessário usar a criatividade para que tudo se encaixe corretamente.
No entanto, é provável que um lojista que tenha o equipamento desenvolva maneiras mais práticas de instalar os sensores, incluindo soluções personalizadas para as bikes mais comuns ou aquelas que ele mais recebe em sua oficina.
Além disso, por ser um sistema com fios, a bicicleta acaba ficando com o visual bastante poluído, e há o risco de algum cabo enroscar em algo, causando danos ao equipamento. Por isso, uma instalação cuidadosa é essencial, até mesmo para garantir que nenhum plugue fique no lugar errado.
Coleta e análise de dados
Coletar os dados é simples, mas requer um processo minucioso para garantir que a comparação seja sempre mantida entre uma sessão e outra. O ideal é realizar várias vezes a mesma trilha, dando uma “pancada” na suspensão para marcar o início da pedalada, quase como uma claquete.
Durante a pedalada, você realmente esquece que o sistema está instalado na bicicleta, com os sensores no manete de freio sendo a única exceção, e ainda assim, apenas para algumas pessoas. Nosso piloto de testes, por exemplo, tem o hábito de pedalar na subida com as mãos por cima do manete de freio, justamente onde fica o sensor.
Mesmo assim, durante nossa experiência com o produto, os aparelhos de telemetria não influenciaram em nada o rolê, e pudemos focar apenas em pedalar normalmente.
Extremamente detalhado
O sistema é realmente completíssimo, e seria impossível condensar um dia inteiro de aulas neste texto. Por isso, vamos destacar aqui apenas algumas das 14 (!!!) “telas” do programa da BYB, com uma explicação básica do que cada uma delas representa.
Stack View
Uma visão geral do trecho registrado, com detalhes como altimetria, velocidade, curso das suspensões e Força G. No ponto destacado, uma das curvas da trilha Pororoca, no Mobai, o IMU (Força-G) está em 13 G’s, com a suspensão dianteira comprimida em 72% e a traseira em 82%. O máximo de Força G chegou a 18,4 G’s, registrado no canto esquerdo do gráfico.
No mapa do percurso, é possível alterar a visualização em diversas categorias, para saber (por exemplo) onde os freios são mais exigidos, como a suspensão comporta-se em cada trecho e até mesmo em qual parte do percurso você bateu no fim do curso.
Incremental Charts

Mostra o curso das suspensões e a força G aplicada na bike. A ideia é usar essas informações para equalizar o funcionamento da suspensão dianteira e traseira da bicicleta.
Brake Speed Distribution

Uma análise do uso dos freios da bicicleta, que pode fornecer insights sobre como o piloto aciona as alavancas de redução de velocidade. Com ela, é fácil perceber o quanto o atleta “arrasta” os freios ou o quanto ele aciona os manetes de forma curta e potente, já que os sensores são progressivos.
Auto Tuning

O sistema automatizado analisa os dados e fornece uma série de sugestões para que você faça o ajuste preciso da suspensão. Depois de analisar os gráficos e realizar os ajustes, percebemos que as sugestões realmente estavam corretas, o que nos deu muita confiança na análise do sistema
Onde poderia melhorar?
O sistema de telemetria da BYB é realmente muito completo e, por ser um universo totalmente novo para nós, é difícil sugerir o que poderia ser melhor. Mas, de uma forma ou de outra, seu uso seria muito mais simples se fosse sem fio — algo que, segundo o pessoal da Escola Park Tool, já está sendo considerado pelo fabricante.
Além disso, a pressão dos pneus, um item fundamental para o desempenho de qualquer veículo, ficou de fora da análise. Uma sugestão é a criação de um sensor que seria preso na válvula, capaz de medir a variação da pressão do conjunto, fazendo uma analogia com a deformação da carcaça. Em teoria, menos pressão geraria mais deformação, criando uma variação maior na pressão do pneu.
Traçar a relação entre a pressão interna dos pneus, a força G aplicada ou o curso da suspensão, por exemplo, poderia gerar insights sobre qual pressão funciona melhor para cada situação de trilha – interpretar essa informação, no entanto, já são “outros 500”.
Outro detalhe que poderia ser incorporado no sistema no futuro é a leitura de dados de potência e da marcha engatada, o que seria extremamente útil para analisar como a suspensão se comporta quando o ciclista aplica força nos pedais em diferentes configurações de anti-squat, além de possibilitar ajustes para minimizar a perda de rendimento.
Conclusão
A telemetria de suspensão da BYB é realmente um recurso que nos surpreendeu positivamente. Vale destacar que, antes do teste, nosso piloto estava bem reticente e incrédulo, mas sua opinião mudou completamente após dois dias de contato com o produto.
Com ela, o processo de ajustar a suspensão se torna científico, e com isso, os resultados chegam muito mais rápido, economizando o tempo das várias pedaladas necessárias para conseguir um ajuste interessante para a sua suspensão — uma vantagem bastante clara para quem está focado no desempenho e no controle nas descidas.
Mas, mesmo para pilotos de XC e de maratona, a telemetria oferece a grande vantagem de atingir o equilíbrio perfeito entre conforto e rendimento. Com ela, por exemplo, é possível ajustar a suspensão para que ela funcione justamente no ponto de SAG dinâmico, normalmente onde a suspensão foi projetada para operar da maneira mais eficiente — algo impossível de ser feito com a bike parada.
Além de ser interessante para o ciclista, o produto também é uma ótima oportunidade para lojistas que já perceberam que, no momento atual do mercado de bicicletas — e muito provavelmente para o futuro —, o segredo para manter as portas abertas é focar em serviços que fazem diferença para seus clientes, como uma oficina equipada, mecânicos bem formados, bike fit e, agora, o ajuste de suspensão.
Para mais informações sobre o curso de telemetria BYB, acesse o site da Escola Park Tool.
Para mais informações sobre a Telemetria BYB, acesse o site da BYB.
No Brasil, a telemetria BYB é importada, distribuída e garantida pela Corsa Bike Parts.











